Toda mulher precisa de flores
- Mystika Ai

- 4 de abr. de 2023
- 6 min de leitura
Eu nunca contei essa história pra ninguém, que ela não saia daqui.
Há 2 anos atrás, em meados de abril, eu me mudei para uma casa ao lado de outra cheia de gatos, com um jardim super florido e uma horta suculenta.
Lá morava uma mulher de cabelos longos, pele clara, corpo robusto, traços fortes, de uma beleza singular que eu nunca havia visto.
Ela vivia cantando, dançando, brincando com os gatos e cuidando das suas plantas.
Toda manhã ela acordava, olhava para o céu e fazia um sinal de reverência. Parecia estar saudando a natureza e agradecendo por mais um dia. Em algumas noites ela sentava ao lado de uma fogueira e olhava pras estrelas, onde ficava conversando sozinha.
Cada vez que eu cruzava com ela, ela olhava pra mim e sorria. Seu sorriso parecia abraçar a minha alma, alcançando partes minhas que nem eu mesma conhecia.
Em dias que eu não conseguia deixar de transbordar minha tristeza, ela sempre aparecia com flores frescas, recém colhidas do seu jardim, e com um sorriso quente e acolhedor. Ào s vezes ela segurava minha mão, ora passava a mão na minha cabeça, sempre sem dizer uma palavra.
Os dias foram passando e eu fui nutrindo uma grande admiração por aquela mulher. Ela era tão confiante, tão cheia de si, tão livre.
Nunca tinha tido um inverno tão caloroso quanto o desse ano que me mudei pra essa casa. Acreditem, se quiserem, mas mesmo no inverno, as flores estavam sempre vívidas e vibrantes.
Chegou 1 de outubro e pela primeira vez, ao final de um dia, eu vi um homem entrar em sua casa. Bem que eu não entendia como uma mulher tão incrível pudesse estar sozinha.
Passaram-se mais três dias e em outra noite, eu vi outro homem entrar em sua casa.
- Será que não deu certo com o outro homem? - Pensei comigo.
Mais três noites depois, um terceiro homem apareceu.
- Será que ela é uma mulher tão difícil assim que nenhum homem quer ter uma relação com essa mulher? - Pensei. - Tomara que dessa vez dê certo. Ela parece ser uma mulher tão incrível.
Passaram-se mais 3 noites e um quarto homem apareceu. Dessa vez, fui até meu quintal, me esgueirei perto da cerca que separava nossas casas, pra tentar descobrir o que ela estava fazendo com tantos homens diferentes. Foi então que pude ouvir uns gemidos. Corei na hora, parte minha queria sair correndo de vergonha, mas outra parte me paralisou e manteve meu olhar vidrado na janela do quarto da vizinha. Nesse momento, a nuvem que cobria a lua cheia, se dissipou e pude ver aquela mulher cavalgando em cima daquele homem. Ela me viu e sorriu, sem parar o que estava fazendo. Eu saí correndo na hora, extremamente encabulada por ter sido descoberta.
Na manhã seguinte, não consegui cumprimentá-la. Só fiquei observando de longe, ela em sua rotina diária levando os sacos de lixo preto para a parte de trás da casa, onde ficava a parte mais florida e frutífera do seu jardim. Realmente era um jardim muito encantador.
Foram se passando os dias e eu acabei só observando ela de dentro de casa mesmo, tamanha a vergonha que eu estava.
Mais 3 noites depois, outro homem apareceu. Esse já era o quinto do mês. Fiquei impressionada com a disposição e organização dela enquanto a esses encontros. Me fez lembrar da minha vida de solteira e da liberdade que eu sentia.
- O que foi que aconteceu comigo? Como vim parar nessa relação? Eu queria sentir o que ela sentiu, enquanto sentava naquele homem. - Pensei comigo em um suspiro de tristeza.
Eu queria tanto sentir o que aquela mulher sentiu, que comecei a imaginar que eu era ela. Fiquei criando histórias eróticas em minha mente, onde eu me encontrava com cada homem que ela se encontrou. Voltei a sentir prazer e meus desejos transbordavam cada vez mais. Voltei a me sentir viva e criativa.
Eu estava lá, na janela, mais 3 noites depois, esperando o próximo homem que ela iria receber. Queria observar cada traço para poder alimentar minha imaginação.
Já era meados de outubro e ela já havia passado a noite com 6 homens diferentes, e sua pele reluzia cada vez mais. Seu brilho me fazia lembrar da vivacidade das flores. Como eu desejava ser ela e de certa forma eu era, quando me perdia em meus pensamentos. Confesso que me trancava no banheiro e me tocava ao imaginar as histórias.
Meu marido não podia nem sonhar sobre nada disso, era extremamente ciumento. Eu fazia tudo bem escondida dele.
-Será que esses homens sabem uns dos outros? Será que não sentem ciúmes?- Pensei um dia comparando minha relação com a que ela tem com esses homens.
Enquanto divagava sobre isso, me dei conta que não vi nenhum desses homens sair da casa dela na manhã seguinte.
-Será que eu não notei eles saindo? Mas eu tava o tempo todo observando. Ué? O que aconteceu? Será que eles foram embora no meio da noite e não vi?
Esperei mais 3 noites, outro homem apareceu. Fiquei acordada a noite toda até o amanhecer e nada desse homem sair. No dia seguinte, somente ela saiu e fez sua rotina diária de levar os sacos de lixo preto para o seu quintal.
Fiquei encucada com aquilo, comecei a lembrar dos detalhes de cada encontro e repassá-los em minha mente, desde o momento da chegada até a sua rotina no dia seguinte. Foi então que, um pensamento muito sinistro passou pela minha mente.
- Todo dia seguinte, pós os encontros, ela sempre leva um saco de lixo grande e aparentemente pesado pra parte de trás do quintal e nunca vi ela levá-los para a frente nos dias de coleta. - Pensei. - Não pode ser o que to pensando.
Eu precisava confirmar o que se passou em minha mente, por mais insano que parecesse, não parecia haver outra explicação. Então, fui até meu quintal e espiei através da cerca o jardim dos fundos da casa daquele mulher. Não havia nenhum saco de lixo, somente um jardim encantador, uma composteira enorme e nenhum cheiro suspeito.
-Será que ela fez o que tô imaginando?? - Pensei comigo, sem acreditar muito. Afinal, era um absurdo o que eu estava imaginando.
Mais três noites depois e a mesma rotina aconteceu.
-Eu preciso descobrir o que está acontecendo. - Pensei.
Algumas horas depois, tomada por pensamentos sombrios, tracei um plano.
Quando meu marido chegou a noite do trabalho, contei para ele sobre essa mulher, falei sobre seus cabelos longos, corpo sinuoso e seu sorriso encantador. Comentei que ela dormia com um homem diferente a cada 3 dias e insinuei que ela talvez fosse uma garota de programa. Meu marido me olhou com um ponto de interrogação na cara, sem entender muito o motivo de eu estar falando sobre essa mulher.
No dia seguinte, ele que até então nunca havia reparado nela, começou a observá-la e pude perceber um sorriso malicioso em seu rosto. Alguns dias se passaram e meu marido já quase não conseguia mais esconder o desejo que ele tinha por aquela mulher.
Chegou o último dia do mês de outubro, dia das bruxas. Nesse dia, meu marido me ligou no meio da tarde e disse que havia acontecido um imprevisto em outra filial da empresa que ele trabalhava e que precisaria viajar para resolver os problemas. Completou dizendo que não teria nem tempo de passar em casa e iria direto do trabalho, mas voltava no dia seguinte.
Nesse dia, já haviam passado 10 homens pela casa daquela mulher. O último havia ido na noite anterior, mas mesmo assim meu instindo dizia que meu marido iria aparecer na porta da casa dela. Quando chegou a noite, lá estava ele na porta da minha vizinha.
Três noites depois, meu marido ainda não havia voltado pra casa e mais nenhum homem apareceu na porta daquela mulher.
Na manhã seguinte, eu tive coragem de ir para o quintal novamente e encontrei minha vizinha adubando suas flores. Ela se levantou, olhou para mim, sorriu e disse:
-Finalmente você se lembrou da mulher corajosa e livre que você sempre foi. Vá e viva suas escolhas.
Em meio a lágrimas e sorrisos, eu saí correndo, arrumei minha mala e nunca mais voltei para aquela casa.
Alguns meses depois, eu ouvi dizer que antes de mim, outro casal também morou lá e o homem desapareceu misteriosamente na noite do dia 31 de outubro. Foi então, que eu entendi, porque aquele jardim era florido e vívido o ano inteiro.

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